14 de fev. de 2008

O Si Mesmo e o Mito Cristão

Produzirei este trabalho vendo o si-mesmo como o arquétipo da totalidade, como o centro regulador dos fenômenos da psique, possuidor de poderes transpessoais transcendentes ao ego e identificando o seu vínculo com o mito cristão, mas antes, partindo do princípio da totalidade e de centro regulador, abordarei, considerando a priori o seu dinamismo, alguns fatores, estes contidos no si-mesmo.



O EU

Constituindo-se como o centro do campo da consciência, estando nele incluso também a personalidade empírica, o “eu” é o sujeito de todos os atos conscientes do indivíduo, dai ele vir a ser o fator complexo com o qual todos os conteúdos conscientes se relacionam e esta relação dos conteúdos psíquicos com o ‘eu” se desenvolve como aferidora da tomada de consciência deste, considerando-se que ele é o sujeito de todo o processo.

Embora seja impossível antever os limites do campo da consciência numa visão teórica, os limites do sujeito, conforme descrito acima fica bem descrito e definido, porém, os limites da consciência poderá estender-se de maneira indeterminada e de forma empírica alcançar sempre o seu limite quando ele se depara com o desconhecido, este constituído de tudo que ignoramos e que não tem vínculo com o “eu”, visto este, como o centro da consciência. O desconhecido aqui aventado, divide-se em dois grandes grupos:

- Aquele que se refere aos fatos exteriores por nós alcançados através dos nossos sentidos;
- O concernente ao mundo interior, este sendo o objeto da nossa experiência imediata.

Aqui vemos que o primeiro traz o desconhecido do mundo ambiente e o segundo o desconhecido do mundo interior e este é denominado de inconsciente. Jung traz que com base em experiências realizadas o “eu” constitui-se de duas bases: somática e psíquica, a primeira por fatores conscientes e inconsciente e a segunda o “eu” se debruça por um lado sobre o campo da consciência global e pelo outro sobre a totalidade dos conteúdos inconscientes.

A SOMBRA

Provenientes das experiências individuais, os conteúdos resultantes destas ficam no inconsciente pessoal, já aqueles conteúdos que sempre existiram estão no inconsciente coletivo e constituem o que Jung denominou de arquétipos. A sombra, a anima e o animus são os que de forma empírica mais se caracterizam e são os que frequentemente e de maneira intensa influenciam ou perturbam o “eu” e a sombra é a que mais facilmente se torna acessível à experiência, isto devido à possibilidade de aprofundamento do conhecimento da sua natureza.

Para Jung a sombra se constitui como um problema de ordem moral, problema moral este desafiador da personalidade do “eu” como um todo, já que segundo ele ninguém é capaz de conhecer esta realidade sem o dispêndio de energias morais e ele traz que o reconhecimento dos aspectos obscuros da personalidade exatamente como existem na realidade se realiza a partir da tomada de consciência da sombra.


De alguma maneira, a sombra pode vir a ser integrada na personalidade a depender do nível de compreensão e boa vontade da pessoa, apesar da resistência efetivada por certos traços ao controle moral. Tais resistência de maneira geral vinculam-se a projeções não reconhecíveis e o seu conhecimento exige um vigor moral que transcende os limites habituais da pessoa. A projeção em si já existe previamente, uma vez que quem projeta e o inconsciente e não o sujeito.
A percepção das ilusões por parte do “eu” é dificultada pela intervenção das projeções no processo de relação do sujeito com o mundo exterior.


ANIMA E ANIMUS


Conceito construído por Jung, a animaé ao mesmo tempo um complexo pessoal e uma imagem arquetípica da mulher na psique masculina. Identificando-se no início com a mãe pessoal ela passa a vivenciar mais tarde não só em outras mulheres, mas também a influenciar a vida de um homem. A anima é responsável pelo mecanismo da projeção.


O homem traz consigo uma imago da mãe, da filha, da irmã, da mulher amada, da deusa celeste e todas elas vêm a ser o veículo e a encarnação dessa imagem atemporal e onipresente que se adequa à realidade existente no âmago da alma do homem.

Associada ao princípio de Eros, a anima personifica-se nos sonhos através de imagens de mulheres as quais se manifestam de forma sedutora ou como guias espirituais. Ela atua na psique do homem como alma influenciando suas idéias, atitudes e emoções.

Igual à anima no homem, o animus na mulher é ao mesmo tempo um complexo pessoal e uma imagem arquetípica. Ela traz consigo sob forma de compensação um componente masculino. Jung denominou a este fator de projeção na mulher de animus significando mente ou espírito, ele diz que o animus equivale ao Logos paternal e a anima ao Eros maternal.

Celeiro de todas experiências ancestrais das mulheres no que se refere aos homens, o animus nestas se parece mais com uma mente inconsciente que se manifesta de forma negativa através de idéias fixas, opiniões coletivas e preconceitos inconscientes que a princípio age como se fosse detentora da verdade absoluta.

“Uma mulher possuída pelo animus sempre corre o risco de perder sua feminilidade.

Ao que parece o aumento do conhecimento produzido pela retirada das projeções, ou seja a integração dos conteúdos coletivos inconscientes exercem de alguma forma influência sobre a personalidade do eu. Há de se esperar um resultado positivo já que os conteúdos integrados compõem uma parcela do si-mesmo e sua apropriação amplia as fronteiras do campo da consciência, bem como do campo da consciência.

Quanto maior for o número de conteúdos assimilados ao eu e quanto mais significativos forem, tanto mais o eu se aproximará do si-mesmo, mesmo que esta aproximação nunca possa chegar ao fim. Isto gera inevitavelmente uma inflação do eu, caso não se faça uma separação prática entre este último e as figuras inconscientes.

Jung C.G. – vol IX-2


Aquele que vir a não reconhecer os fatores de projeção que são de uma realidade inquestionável identificar-se-á com estes e isto será bastante danoso para o seu processo, haverá uma inflação de ego e esta é bastante danosa para a vida, ela avoluma o ponto cego do olho e ele tenderá a se identificar com o fator de projeção na medida em que se é tomado por este fator.

A apropriação do eu pelo si-mesmo deve ser compreendida como uma catástrofe psíquica, neste dinamismo a imagem da totalidade fica imersa no na inconsciência e por esta razão ela convive com a sua natureza arcaica e uma vez contida no inconsciente ela se repetirá no espaço e no tempo, confirmando assim esta característica do inconsciente que é numinosa e determinante para a consciência do eu que é diferenciada e separada do inconsciente.

Faz-se necessário para o processo de individuação, o fortalecimento da consciência buscando uma adaptação a mais apropriada possível, assim como a promoção do enraizamento do eu no mundo da consciência.

Jung traz que a conscienciosidade, a paciência no que se refere à questão moral e a correta consideração dos sintomas do inconsciente, assim como a autocrítica objetiva no nível intelectual vêm a ser de grande valia.

O SI-MESMO

Concluir que a autoridade interior, decorre de forças naturais ou dos instintos, baseado numa interpretação racionalista, poderá satisfazer à inteligência moderna, porém esta decisão aparentemente vitoriosa do instinto traz em si o inconveniente de se manifestada de maneira superficial do instinto vir a agredir a auto-consciência.

Há pela própria cultura, uma tendência de nesses casos, o sujeito vir a construir a realidade de que a autoridade interna se manifesta como sendo uma vontade de Deus e tal construção, embora reflita um ato de obediência o leva a conceber que o seu resultado decorre da vontade dele gerando uma atitude de relaxamento moral acobertado por uma falsa virtude.


“É mais vantajoso. E também psicologicamente mais “correto” considerar certas forças naturais que se manifestam em nós, sob a forma de impulsos, como sendo a vontade de Deus – Com isso nos pomos em consonância com o “habitus” da vida psíquica ancestral, isto é, funcionamos tal qual tem funcionado o ser humano em todos os lugares e em todas as épocas”.

Jung C.G. – vol IX-2


“Será possível que Deus, personificação do Bem Absoluto, também tenha uma sombra, um lado escuro, uma tendência para o mal, uma natureza destrutiva ”

O’Kane Françoise – A Sombra de Deus



No encontro com “Deus” ou com o “Demônio”, ao homem está reservada a decisão ética e ele precisa saber sobre o que está decidindo, bem como sobre o que está fazendo

Devemos considerar que sob o viés da hierarquia afetiva, que a anima e o animus estão para a sombra, da mesma maneira que a sombra está para a consciência do eu e ao que sugere com a ênfase afetiva concentrada recai sobre esse e a tomada de consciência do eu leva a uma repressão momentânea da sombra com uso excessivo de energia. Por~em se o inconsciente por alguma razão vir a conquistar a supremacia no processo a valência da sobra aumenta.